Lá fora, não há vivalma,
nada cresce, nada se assoma.
Por detrás deste inverno, (finalmente) silencioso,
é estranho encarnar assim o espírito de outros vivos,
desses todos que esperam, ainda devedores à vida,
na sala de espera da morte.
Não há monção que nos molhe,
nem glaciar que, mudo e liso,
nos empurre do sofá
quando vemos, incrédulos,
a velocidade da Premier League.
O telefone toca, levantamo-nos:
e "É o primo da Figueira", dizemos,
mas não encontramos coragem
para interromper
aquilo que escrevemos.
O tal poema, qual círio,
que avança pela manhã
sem destino nem esperança,
a não ser a beleza rasa
que vi, na infância,
em certos prados espontâneos
nos arredores da Caparica.
Voltará a chover?
Hoje não creio.
E até da chuva descremos.
Nós que tão facilmente
aprendemos a esperar com os gatos
e a seguir com os cães,
agora que os macacos tomaram o poder
com a facilidade que lhes conhecemos
em trepar qualquer espécie de árvore.
Cá em baixo passeiam as gazelas,
assustadiças
aos tremores da bolsa de valores.
E, se alguma coisa o bem permite,
é uma asa de gaivota
que passa rasante à vidraça
para nos lembrar
que mesmo longe do mar o mar existe
e que podemos partir, quando quisermos,
para a ilha dos amores.
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