10/05/2021

Aguaceiro



 
O poeta transforma a realidade através do filtro da sua fantasia. Tudo em seu redor passa a ser um reflexo subjetivo de uma consciência onírica e fugaz. Pelo menos comigo, as coisas passam-se assim. Há um momento de criação que nasce e morre num curto espaço de tempo. Deixa para trás um cadáver ou uma semente: se for o primeiro caso, o poema desfazer-se-á com o tempo; caso contrário, crescerá como uma bela planta que dará cor, perfume ou sombra durante mais algum tempo.

Hoje de repente o céu enegreceu. Em meu redor, tudo tomou um novo sentido. Quem conhece a minha sala, entenderá melhor os elementos deste poema. Quem não conhece ainda, começará pelo fim, ou seja, pela realidade alterada. Depois a chuva começou a cair. Senti que precisava de escrever um poema para me abrigar ou desfrutar  daquele momento. Escrevi assim:

Chove lá fora
e dentro de mim.
O comboio leva e traz 
gente estática.
O peixe aguarda
no silêncio do tanque
uma fresta
que não se abre.
A gata acoita-se;
julga que a chuva 
se zangou com ela.
Recolho-me eu
no alpendre da poesia,
exercício vital
para a flutuação das pedras
em dia de aguaceiros.

5 comentários:

Luis disse...

gosto da flutuação das pedras

Luís Palma Gomes disse...

Realmente é a única metáfora digna desse nome. Mas é como todo o poema convergisse para ela.

solfirmino disse...

Chove aqui também.

Luis disse...

diria alguém que a convergência contém em si a divergência

e a flutuação, o que contém em si?




























































alguma coisa há-de ser

Luís Palma Gomes disse...

Na mesma linha de pensamento, a flutuação contém em si a profundidade.