Assisti a uma intervenção sua no lançamento do livro de ensaios sobre
a obra do Ruy Belo, “Literatura explicativa” da Assírio & Alvim. Tinha um sotaque
estrangeiro, mas articulava com grande rigor e riqueza a língua de Camões. A
sua intervenção saía dos canones habituais. Tinha humor e uma provocação
propositada. Fiquei com curiosidade de quem seria a tal menina e procurei-a na
internet. Afinal era a poetisa romena Golgona Anghel. Já tinha ouvido falar do
seu livro “Vim porque me pagavam” da Mariposa Azul. Comprei-o. Ando a lê-lo e a
deliciar-me (às vezes deixo escapar mesmos umas gargalhadas tal a qualidade da
sua ironia).
Deixo-vos um dos poemas:
Vim
porque me pagavam,
e eu queria comprar o futuro a prestações.
e eu queria comprar o futuro a prestações.
Vim
porque me falaram de apanhar cerejas
ou de armas de destruição em massa.
Mas só encontrei cucos e mexericos de feira,
metralhadoras de plástico, coelhinhos da Páscoa e pulseiras
de lata.
ou de armas de destruição em massa.
Mas só encontrei cucos e mexericos de feira,
metralhadoras de plástico, coelhinhos da Páscoa e pulseiras
de lata.
A
bordo, alguém falou de justiça
(não, não era o Marx).
A bordo, falavam também de liberdade.
Quantos mais morríamos,
mais liberdade tínhamos para matar.
Matava porque estavas perto,
porque os outros ficaram na esquina do supermercado
a falar, a debater o assunto.
(não, não era o Marx).
A bordo, falavam também de liberdade.
Quantos mais morríamos,
mais liberdade tínhamos para matar.
Matava porque estavas perto,
porque os outros ficaram na esquina do supermercado
a falar, a debater o assunto.
Com
estas mãos levantei a poeira
com que agora cubro os nossos corpos.
com que agora cubro os nossos corpos.
Com
estas pernas subi dez andares
para assim te poder olhar de frente.
para assim te poder olhar de frente.
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