11/02/2013

O mentor e o crente



O filme "O mentor" mantém-se-me  no pensamento durante vários dias. A força do argumento, das personagens e da interpretação de Joaquin Phoenix e de Philip Seymour Hoffman deixam-me "algumas pontas por atar" com outras problemáticas profundamente humanas. Uma delas, aquela que me mais interessa, é a Fé. Muitos dos filmes que mais me marcaram abordam este mistério da confiança humana (a fé): "A palavra " do Carl Dreyer, "As ondas de paixão" do Lars Von Trier e "A vida continua" do Abbas Kariostami.


O que mais impressionou na personagem de Freddie Quell é a sua capacidade em acreditar. Relevante também, por anteposição, é  a forma como o cinema norte-americano trata aqueles que acreditam de forma absoluta em fenómenos fora dos seus cânones.  O portador da fé é representado como um psicótico, alcoólico, sem rumo ou profissão fixa - enfim um renegado social. Na realidade, no espartilho lógico e linear de uma sociedade profundamente marcada pelas relações diretas de causa-efeito, acreditar sem razão parece aberrante, mas não o é. A fé é uma qualidade profundamente humana e ajuda-nos a seguir ou a prosseguir. Porque  ela traz-nos sempre força redobrada para continuar e ultrapassar os obstáculos.  Quando se acredita no mais profundo (ainda que misterioso) e se desvaloriza o superficial, a fé acontece. E creio que foi isso que aconteceu à personagem Freddie. Freddie ignorou o cepticismo dos outros membros da seita, o misticismo barato dos rituais e algumas conclusões mais absurdas em redor das teorias do Mentor. Porém, aquele "Mentor" acreditou nele, foi o pai calmo e tolerante que ele nunca tinha tido. A relação que se foi  estabelecendo entre eles, ao longo do filme, ganhou uma dimensão sagrada e, quando assim é , o homem cresce e ultrapassa-se, porque o crente ganha confiança para se afirmar.



A ciência  interessa-se apenas por matérias que pode comprovar. A fé não é um fenómeno comprovável pelo seu modelo. Ela está  no âmbito da religiosidade e essa está em crise no Ocidente ou foi trasladada para uma dimensão "Disney", ou seja, infantil e desadequada da maturidade da dimensão histórica europeia.



Nota: É  tempo de renovar a fé e trazer a confiança ao seio das comunidades. É tempo de um catolicismo que  faça acreditar os mais simples primeiro e apenas os doutores depois.  Mas que, no entanto, não seja simples demais - que não se tente auto-explicar -  porque a fé não se explica.



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