E agora, Senhor Emérito do Universo,
Senhor dos Brinquedos e da Vida Perfeita,
que nos fica na memória
quando já não há louvor, nem cântico de água que te possamos entoar?
E agora, Senhor, que a tua luz se abre sobre um novo cruzamento?
“Eis-me aqui, Senhor. Eis-me aqui para fazer a tua vontade.”
Cordeiro que se leva a si mesmo ao altar do seu sacrifício,
à luz imparável que perpassa os vitrais partidos.
Eis-me aqui, Senhor, aguardando uma cruz à minha escala e graça,
uma espada de brincar que possa cortar sombras
e o roncar dos carris quando se aproxima o comboio do suicida,
do poeta lusíada que pensou ouvir a voz de Deus
numa capoeira que havia nas traseiras,
e afinal eram apenas o rugir dos aviões
que descolavam para todos os lugares do mundo
onde ele nunca irá —
e só por isso se afirmam, por lá, os Jerusaléns da sua alma,
essa coisa esquisita que já ninguém tem.
Bem dizia a Adília que Deus agora é a nossa mulher-a-dias,
velhinha que nos arruma a casa por pouco dinheiro,
mas é quando nos falta que sentimos a falta que faz.
Zás
Zás
Zás
Nem me posso desculpar com a chuva,
porque está um dia de truz,
tudo ao sol reluz:
a erva, a gata, a coragem que inventamos nos outros,
mas deverá ser tão pequena como a nossa.
Desce, Cristo.
Desce com a tua parada de anjos, com o teu jugo manso.
Vem visitar-nos mais uma vez para podermos cantar-Te os Aleluias verdadeiros
das areias, dos judeus,
da caravana da seda que nos levava brilhantes até ao sol nascente.
Vem, Cristo. Vem outra vez.
Bate-nos à porta e responde:
“Sou eu. Sou eu o teu Deus, caramba.”
“Abre tu, Fatinha, que eu agora não posso. Logo hoje que não fiz a barba.”
“Não faz mal. Ele é misericordioso”, alguém mo lembra.
Nada nos embala melhor do que uma canção,
do que aquela sensação aconchegante de ainda faltar meia hora
para nos levantarmos da cama.
E não me venham dizer que é pouco o poema que tudo pode,
que tudo cria — até ressuscitar Cristo-Homem nas folhas, meu Deus,
nas folhas de um moleskine.
1 comentário:
La poesía sigue siendo la que nos abre la puerta de la jaula y nos señala el camino para que no vuelvan a encerrarnos con tanto malintencionado palabrerío y en nombre de los mejores ideales...
Bravo una vez más!!
Así se hace, Poeta!!
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