25/04/2024

Teleological issues


Escrever...escr... esc da tecla "Escape"


Certo dia perguntarás:

"Escrever para quê, para quem?

Se o esquecimento se apropriará de tudo:

dos meus poemas, da língua em que os escrevi

e mais tarde do planeta onde a língua se falava 

ou mesmo do universo onde ele rodava, rodava

como a saia de um dervixe turco."


"Um leitor basta, apenas um. 

A diferença entre nenhum e um leitor

 é maior do que entre um  e cem leitores",

 disseste numa entrevista há muitos anos.

Ainda que agora, ao tornares-te um escritor de “bestsellers”, o negues

ou simplesmente digas que não te lembras de ter dito tal coisa.


Quando as máquinas escreverem e lerem os melhores poemas,

alguém colocará num site de venda e compra de coisas usadas:

"Leio o teu poema e apaixono-me por ti durante 20 minutos 

— 12 euros (a negociar)".

E perceberás então que será realmente na negociação do preço/tempo

que estará, escondido e subliminar, o poema humano,

aquele que depende exclusivamente do futuro.






20/04/2024

Entretenimento

Há vozes ao longe.

No aquário, os peixes perseguem-se.

Finjo entendê-los, como entenderia a tradução de um poema islandês.

A luz entra por um estreito vitral que inventei na sala.

É a manhã a desfazer a noite.

Há de novo esperança, mas não muita.

Apenas uma nesga, uma mão cheia,

o feixe suficiente para sobrevivermos

com uma só ração de combate.


Devem ser quase horas para qualquer coisa.

Não sei bem o quê, mas é sempre assim.

Sempre uma coisa a seguir à outra.

Tudo flui ou outra coisa parecida, escreveu Heráclito.

É difícil de traduzir, o grego antigo.

Mas é isso: nunca sabemos nada com exatidão

 porque tudo se mexe continuamente: placas tectónicas, conceitos. 

 Mesmo frases fundamentais movem-se sem darmos por isso,

 como caracóis noturnos escalando as paredes da adega. 


Onde estarei eu agora em criança?

Provavelmente, deitado sobre a duna, 

olhando o escaravelho preto

e o seu longo rasto por entre os cardos bicudos.

A minha mãe está do outro lado — segura e aliviada —

descansando da semana de trabalho na fábrica bombástica.

O meu irmão brinca à sua frente numa poça tépida.

Ela, confiante, porque sabe e sente 

que ando entretido pela Terra


Criado pelo DALLL E 3




14/04/2024

Estranha velocidade

 Só agora entendi todos os traços que delimitam

a ganância e a avareza.

Como brilham e ofuscam tudo aquilo que nos parece o bem.

Dizem serem o motor do mundo.

Acredito.

Basta olhar pela janela de um comboio em andamento

e todos percebemos a velocidade em caminhamos para o fim.


Tradução:


"Only now I understand all the traits that define

greed and avarice.

How they shine and dazzle everything that seems good to us.

They say its are the engine of the world.

I believe it.

Just look out of the window of a moving train

and we all perceive the speed at which we are heading towards the end."