10/07/2024

Fazer contas à vida

Todos sabem que a poesia é coisa de burgueses.

Cada um terá de encontrar a sua renda.

Quem a não tiver

(Pessoa, não teve; Camões, não teve; Pessanha, não teve)

terá de pagar com vinte vergastadas no lombo

cinco dias por semana,

mais quatro manhãs, por mês, num hipermercado perto de si.


Sem renda e com mulher e filhos, terá de multiplicar

as vergastadas por dois

e dividir o número de poemas por cinco.

1 comentário:

Luís Palma Gomes disse...

Manel dias escreveu sobre este poema depois de o receber: "Mais vale um só poema resgatado entre cinco, e suado de um corpo moído, que uma dúzia de vulgaridades de burguês com renda (e com punhos de renda). Esta tua contabilidade é da melhor e sacrificada extração. Luís, gosto mesmo muito"

Gosto muito do Manel. Foi ele que me quis poeta, a mim a tantos outros da minha geração.