"Sou um mero espectador da vida, que não tenta explicá-la. Não afirmo nem nego. Há muito que fujo de julgar os homens, e, a cada hora que passa, a vida me parece ou muito complicada e misteriosa ou muito simples e profunda. Não aprendo nada até morrer - desaprendo até morrer. Não sei nada, e saio deste mundo com a convicção de que a paixão e a quimera nos levam a resoluções definitivas. O papel dos doidos é de primeira importância neste triste planeta, embora depois os outros tentem corrigi-lo e canalizá-lo..."
24/04/2020
22/04/2020
Quarentena - II
À noite,
Quando me deito
Escolho um sonho entre as lembranças
E construo com ele o tal mito
Em que acredito ser eu próprio.
21/04/2020
Quarentena - I
Hoje não tirei o pijama. Trabalhei com ele o dia todo. Quando a tranquilidade possível - numa cidade como a Amadora- chegou, fui até à janela, olhar um renque de árvores que vivem do outro lado da linha férrea.
"Qualquer dia, cortam-vos." - pensei eu, aborrecido com o abate de árvores que o município tem promovido em algumas zonas.
É o preço da imobilidade, a desvantagem de quem não pode fugir, a inércia semelhante àquela que um pijama velho e gasto traz ao corpo.
"Qualquer dia, cortam-vos." - pensei eu, aborrecido com o abate de árvores que o município tem promovido em algumas zonas.
É o preço da imobilidade, a desvantagem de quem não pode fugir, a inércia semelhante àquela que um pijama velho e gasto traz ao corpo.
15/04/2020
Parado
Insone e atento
aos reflexos nas vidraças,
aguardo o instante
em que o ribombar do trovão
ou tão só a notificação digital
dar-me-á o sinal que o mundo mudou
e eu não.
13/04/2020
Do sotão dos moleskines
Perdidos no tempo e em velhos moleskines - que empilho onde calha na secretária - releio agora alguns desses poemas, neste tempo de quarentena:
Dedilho as vagas
como cordas de uma arpa
procurando o meu par
no fundo do mar.
O que se passa? Não sei.
Talvez o destino o lançasse
às água profundas
de uma chávena de chá.
Dedilho as vagas
como cordas de uma arpa
procurando o meu par
no fundo do mar.
O que se passa? Não sei.
Talvez o destino o lançasse
às água profundas
de uma chávena de chá.
08/04/2020
01/04/2020
Ninho abandonado
oca, noz desmiolada
O sangue fluiu
pela mesma fresta
onde o frio entra agora
A cal das paredes caiu
porque eram as asas dos anjos
que a escoravam intacta
Os tectos refletem apenas
o ocre velho
dos corações maduros
E até a fruta perdeu
aquela acidez benfazeja
das coisas novas e nubeis
Levaram o calor
que a raiz leva à flor
sem lhe pedir mais nada
que o primeiro odor da madrugada
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